Não sei por que, mas direto vem alguém me pedir dicas do que fazer em São Paulo. Desde que abri uma conta lá no Curious Cat essa é de longe a pergunta que eu mais recebo, o que acho engraçado porque eu não moro em São Paulo e nem passo tanto tempo assim por lá (enquanto várias pessoas moram na cidade e estão todos os dias ativamente produzindo conteúdo sobre O Que Fazer em São Paulo), e a verdade é que sempre que vou pra lá acabo fazendo as mesmas coisas -- que nem são coisas tão legais e surpreendentes assim.
Não sou a pessoa que vai conhecer aquela portinha que você não dá nada que é o restaurante incrível do momento, mas a pessoa que adora andar na Paulista aberta aos domingos para brincar com os golden retrievers e toma isso como obrigação religiosa em toda a visita. Eu sou a pessoa que se emociona andando na Paulista, que adora usar Bilhete Único e que sempre esquece de tirar fotos, o que me torna uma péssima candidata a blogueirinha de turismo. Eu gosto de ir na Bella Paulista comer bolo de morango.
Mas recentemente a Laura Pires escreveu no Facebook um texto sobre São Paulo que, pela primeira vez, me deu vontade de falar sobre as coisas que gosto de fazer em São Paulo. Como esse ano acabei passando bastante tempo lá, decidi começar esse pequeno inventário de memórias com meus lugares favoritos.
Vou a São Paulo pelo menos uma vez por ano, há anos, e conheço muito pouco da cidade. Isso porque sempre vou para ver pessoas queridas que moram em São Paulo. Passo boa parte do tempo dentro da casa delas, inclusive, e a cidade, bem, sempre esqueço de comer hambúrguer de pão-de-queijo e tudo mais que a cidade tem pra oferecer.
Vivo reclamando que moro numa cidade onde não tem nada pra fazer (NADA), mas São Paulo tem tanta coisa pra fazer que fico meio paralisada, não consigo escolher. Gosto de lá porque é um lugar com uma enorme concentração de pessoas que gosto, mas não consigo ver sempre, por isso acabo pedindo que essas pessoas me levem nos seus lugares favoritos e pra mim vai estar tudo ótimo. Às vezes esse lugar acaba sendo mesmo a cozinha dos meus tios, onde eu sento com uma gatinha no colo enquanto o Pedro faz um drink pra nós com desenvoltura de Don Draper e alguma música toca muito alto no som; às vezes esse lugar é o quarto da Clara, cheio de coisas que eu amo fuçar; às vezes é passar o dia inteiro num mesmo café e fazer ali duas ou três refeições sem sair do lugar. E às vezes o lugar é um restaurante vegetariano oriental no meio da Luz em que é impossível saber o que é cada coisa, mas tudo é bom, então talvez essas dicas façam sentido pra alguém no fim das contas.
Há duas semanas estava em São Paulo, andando na Paulista num perfeito fim de tarde outonal em plena primavera, o céu aberto depois de muita chuva, o shuffle me mandou Pot Kettle Black e foi um daqueles momentos bregas em que você se sente universal. Aí eu topei com duas amigas, a Odhara e a Barbie, sem qualquer combinado, tomamos café no mirante que mira uma avenida, depois fui parar numa pizzaria vegana onde comi pizza de rúcula com queijo chèvre vegano (que eu achei mais gostoso que o original, apesar da minha resistência com versões de mentira de produtos de origem animal). Lá era cheio de gente de humanas, claro, mas também muitos idosos e japoneses (e idosos japoneses), uma galera da maromba e também o Afrika Bambaata, cara importante do hip-hop que eu não sabia quem era, mas meu tio ficou tão feliz em ver que achei importante mencionar.
É isso. São Paulo é o lugar dessas possibilidades malucas que não se vê em nenhum outro lugar e é isso que eu adoro por lá. Isso e o fato de ser uma cidade que sempre me deixa entrar e é por isso que nossa música não é Sampa ou Trem das Onze, mas Let Me Back In.
Meus lugares favoritos em São Paulo
Eu devia ser proibida de tirar fotos turísticas
1) Pinacoteca + Jardim da Luz ou o centro é tudo, o centro é lindo
A dica que eu dou pra todas as pessoas que me pedem dica do que fazer em São Paulo é sempre a mesma: Pinacoteca, ou pitaconeca, como eu gosto de chamar. É o museu mais antigo da cidade e um dos prédios mais bonitos e legais que já vi. Mesmo se não tivesse exposição alguma já valeria a pena. O acervo fixo deles é bem bacana, mas nunca fui lá e encontrei uma exposição itinerante que não fosse legal. Foi lá que vi Rodin e Mira Schendel. Nunca viajei pra fora e não cresci rodeada de museus, então sempre dou uma choradinha quando vou na Pitacoteca porque arte!!!!
Integrado à Pinacoteca fica o Jardim da Luz. Adoro que exista um parque daquele tamanho no meio do centro, no meio de São Paulo, do tipo que dá pra sentar num banquinho e esquecer por cinco minutos que você está em frente à Estação da Luz. Meu primo chama o parque de deep São Paulo e existem várias deep São Paulo espalhadas pela cidade, mas essa é de longe a minha favorita. O parque já viu dias melhores, está meio abandonado e é no meio da cracolândia, o que significa que não é o lugar que eu vou indicar pra todo mundo sem restrições, mas ainda é o lugar que eu gostaria que todo mundo tirasse um tempo pra conhecer sem restrições, que é o que eu penso do centro de São Paulo de modo geral.
Ano passado passei uma temporada maior na cidade para fazer um trainee e fiquei hospedada no Centro, colada na Rusvel, trabalhando nos Campos Elísios, vivendo intensamente a gentrificação do lugar. O medo durou mais ou menos uma semana, mas logo eu estava indo e voltando a pé todos os dias, às vezes de madrugada, pensando mddc imagina se meu pai soubesse onde eu tô agorLOOK AROUND LOOK AROUND HOW LUCKY WE ARE TO BE ALIVE RIGHT NOW!!! O centro tem os prédios mais incríveis (saudades de quando o Copan era meu ponto de referência pra não me perder), as janelas mais antigas e não tinha um dia que não me sentia privilegiada por poder viver aquele lugar. Se um dia eu for pra ficar, é lá que quero morar.
E como vocês gostam de #diquinhas, além da Pinacoteca e do Jardim da Luz, eu gosto do Rinconcito pra comer ceviche, uma porção absurda em que tudo é frito, absurdo e perfeito e beber limonada; do Lotus, o já citado restaurante vegetariano oriental em que é melhor não perguntar o que é cada coisa (a frase "é uma consistência meio de um fantasminha, mas eu gostei" foi usada para descrever um prato), mas tudo é gostoso e interessante, a decoração mistura motivos chineses com quadro de natureza morta bem kitsh, e a música ambiente é sempre uma surpresa gostosa; o Por Um Punhado de Dólares pra tomar uma taça de vinho no meio da tarde e se sentir muito Europa; o Jardin, que tem o melhor café coado, o melhor chá de hortelã, os melhores bolinhos, além de plantinhas pra vender e plantinhas na decoração pra tirar foto e fazer parte do zeitgeist millennial-vó nas redes sociais.
As dicas da Isadora, da Nicas e da Debs sobre o centro e sobre São Paulo são as únicas que me interessam e indico a vocês de coração.
2) Paulista aberta + Augusta
Esse é o meu lugar preferido mais básico de todos, uma dica que vale mais pra quem não conhece a cidade. Mentira, vale também para quem é de São Paulo porque o paulistano é aquele animal que adora reclamar de tudo que tem em São Paulo, esquecendo o tanto que aquele lugar é DAORA e como poucos lugares no Brasil são tão daora e diversos como São Paulo. Eu tô falando da Paulista. Meu Deus, eu amo a Paulista. Não ligo se isso é coisa de gente provinciana, mas eu amo a Paulista porque as pessoas andam na rua, rápido, trombando em você se não andar rápido também, mas elas andam na rua e eu venho de um lugar onde as pessoas evitam ao máximo andar na rua.
A Paulista aberta foi uma das coisas mais lindas que aconteceram em São Paulo. É maravilhoso pensar que nos domingos e feriados os carros são proibidos de circular. Sempre penso que o pior de São Paulo são os carros e a Paulista aberta é uma São Paulo sem carros e cheia de pessoas. É gente de passagem, gente passeando, gente tirando foto de prédio, pessoas com seus cachorros, grupos de adolescentes insuportáveis e lindos, cachorros, cachorros, cachorros e gente que senta no meio da rua pra sentar, tomar um sorvete ou uma cerveja e ficar por ali. Eu adoro a ideia de que São Paulo é cheio de lugares que você pode simplesmente ficar por ali. Estão cada vez mais chatos e raros, mas existem, e aqui onde eu moro as pessoas te olham estranho se você passa mais de duas horas em algum lugar. E ainda tem o Masp. Eu amo o Masp. Não tanto quanto eu amo a Pinacoteca, mas o suficiente pro coração bater com força e achar que a vista dele é mais bonita que qualquer mirante.
Sempre acabo na Paulista quando não sei pra onde ir ou quando preciso matar um tempo. Adoro descer a Augusta durante o dia para entrar nas lojas e comprar um monte de coisas que não preciso, é o passeio clássico que sempre faço quando estou com as minhas amigas, é o nosso lugar, seja pra comer bolo e um cheeseburguer maionese na Bella Paulista, se enfiar em alguma livraria ou andar cantando por aí.
"Nossa Anna, mas você viaja pra comer hambúrguer e ver livro?"
Sim.
A #diquinha é que você entre em todas as livrarias, em todas as lojinhas, pare pra ver os livros que as pessoas vendem na rua, e pegue um cinema no Espaço Itaú onde tem um bolo de bem casado inesquecível e uma livraria minúscula cheia de raridades. O Urbe é perfeito pra passar a tarde e acho que nunca comi um hambúrguer que não fosse bom nessa região.
O diário de viagem do Felipe pra São Paulo pega bem o espírito da coisa.
3) Liberdade e karaokês
Ir pra São Paulo e não ir no karaokê é quase tão grave quanto ir pra São Paulo e não andar na Paulista. São duas coisas que simplesmente não existem de forma separada na minha cabeça. Eu sempre vou achar karaokê o melhor rolê do mundo e se todos os meus amigos quiserem passar o resto da vida comemorando aniversário em karaokê, eu sempre vou estar presente. As únicas portinhas que você não dá nada que frequento em São Paulo são as dos karaokês da Liberdade. É sempre uma portinha com uma escada, aquele piso de cerâmica feia todo errado e aí você vai subindo e encontrando corredores de portas fechadas por onde sai uma luz azul e dá pra ouvir ecos de Evidências e Anna Júlia.
Prefiro os lugares onde você pode reservar uma sala fechada com os amigos, que é sempre a festa de aniversário perfeita mesmo quando não é aniversário de ninguém. No aniversário da Analu nós cantamos basicamente todas as músicas da Taylor Swift do catálogo, sempre uma experiência tão mágica e única que já no fim da noite o namorado de uma amiga dela perguntou se podia cantar Taylor Swift com a gente com tudo que tinha direito e fazer parte da nossa seita, e essa é a história do dia que cantei Love Story abraçada com uma pessoa que tinha acabado de conhecer.
Sempre tem um bar que parece sujíssimo onde alguma senhora japonesa brava completamente fora de contexto anota as cervejas na comanda e serve batatas fritas, mas esses lugares costumam ter uma parte aberta de restaurante em que famílias comem enquanto num palquinho lá na frente as pessoas vão pra cantar. Vale a experiência mesmo se for só pra ficar olhando (ou puxar o coro e cantar junto, dependendo do quão inconvenientes forem as suas companhias) (eu só ando com gente sem noção, graças a Deus).
Outros karaokês testados e recomendados são os da praça Roosevelt, no centro, e o Vivos Bar, que fica em frente o cemitério, o que já é uma atração em si.
Além dos karaokês, a Liberdade em si é uma enorme deep São Paulo que é diferente de tudo que já vi e merece a atenção especial. É legal visitar aos domingos, quando tem uma enorme feira logo na saída do metrô e também adoro passear pelos mercadinhos cheios de coisas importadas (e baratas!) diferentes e malucas. Lá também é o melhor lugar pra se comprar coisas de passar na cara, estou ansiosa pra montar meu pacote de tratamentos coreanos pra pele numa visita futura.
As melhores músicas pra cantar no karaokê
Todas da Taylor Swift;
Palpite, que ninguém lembra quem canta na hora de procurar no catálogo;
My Happy Ending;
Todas de Sandy & Junior;
Lua de Cristal;
Wuthering Heights, mas só se você for a Juia, responsável pelo número de karaokê mais impressionante que vi esse ano;
Disco da Semana
(What's The Story) Morning Glory? (Yumi Zouma): Costumo ser muito chata com covers porque a maioria acaba sendo uma versão pior e mais preguiçosa da música original (tenho certeza que no meu inferno pessoal o que toca são versões acústicas ou indie de música pop), mas projetos de cover bons de verdade viram obsessão imediata. Foi o caso dessa regravação que a banda neozelandesa Yumi Zouma fez do (What's The Story) Morning Glory?, um dos discos clássicos do Oasis que também é um dos meus preferidos da vida toda. Amo a forma como eles conseguiram se apropriar das músicas pra criar versões frescas, originais e interessantes de músicas que a gente até já cansou de ouvir, como Wonderwall, mostrando que elas ainda podem ser boas e ter coisas inesperadas a oferecer. Ele não tá disponível pra streaming, então vocês vão ter que se empenhar um pouquinho pra achar por aí, mas juro que vale a pena.
Músicas favoritas: forever favorita She's Electric ainda mais perfeita na versão shoegaze, Don't Look Back in Anger, Morning Glory, Wonderwall e Some Might Say
Links, Links, Links
- A Time elegeu as mulheres que denunciaram seus agressores por abuso e assédio sexual como pessoa do ano de 2017 e o trabalho de jornalismo envolvido nesse especial dá muito gosto de ver;
- Muitos textos legais no Valkirias essa semana, se me permitem:
O humor possível de The Good Place, próxima série da minha lista;
A história de Mildred Pierce: não sei nada de literatura policial e filmes noir, mas aprendi tanto com esse texto!
Supergirl e a importância de escolhas das explicitamente políticas da série;
- 20 authors I don't have to read because I've dated men for 16 years;
- Crazy Ex-Girlfriend exposes the double standards of mental illness;
- Uma ótima resenha de Fome, livro novo da Roxane Gay;
- A Pólen está fazendo três anos em dezembro e lançou uma página no Padrim, pra arrecadar contribuições que vão ajudar a revista a se manter no ar. Vamos apoiar conteúdo independente feito por mulheres! O editorial de dezembro escrito pela Lore tá lindo lindo, prestigiem! #polkirias
Viu? Nem doeu.
Sei que disse que os textos desse especial seriam pequenos, mas esse é uma exceção, eu juro. É que antes de ter a ideia do 2017 em Detalhes eu já estava com mais da metade dessa edição normal já escrita e não quis jogar todo esse trabalho fora -- e eu também queria ter um link pra mandar toda vez que eu alguém me pedir dicas do que eu fazer. Juro que o dia que meus go-to rolês mudarem eu conto as novidades.
Também sei que já comecei isso aqui avacalhando, mas juro que as coisas vão entrar nos eixos. Se você chegou aqui agora e não entendeu a mudança temporária de linha editorial, expliquei tudo direitinho aqui.
Até lá, stay beautiful!
Yours truly,
Anna Vitória