Hello stranger, como vai você?
Não sei ao certo como, quando ou quem começou essa brincadeira, mas de repente a cada coisa legal que acontecia, principalmente se fosse algo que eu vinha desejando há algum tempo, comecei a exclamar "O Segredo é real!". Virou um bordão involuntário e se minha vida fosse uma série de TV essa seria uma daquelas piadas recorrentes. Minha opinião sobre a lei da atração que supostamente é o segredo do Segredo (não li o livro) é aquela coisa: não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem e... algumas coisas simplesmente acontecem. Normalmente são coisas pequenas, tipo ter sobrado um croissant de queijo na padaria depois das 18h, naquele dia em que eu realmente estava desejando comer um croissant de queijo, e não sou de subestimar a graça de um croissant alcançado. Chame isso do que você quiser.
Comecei a achar esse papo d'O Segredo engraçado (e quando digo engraçado quero dizer estranho) na primeira vez que fui no Rio de Janeiro. Cheguei lá à noite e logo cedo no dia seguinte fizemos um longo passeio de Freixcão para buscar a Analu no aeroporto, do Galeão até o fim da linha, num trajeto que passa por toda a orla da zona sul. Eu tinha 20 anos e não lembro de ter me sentido tão ARREBATADA antes pela beleza de algum lugar como fui e continuei sendo durante toda aquela viagem. Ainda no ônibus, no primeiro dia, comecei a pensar: eu não quero ir embora daqui. Lembro de estar na praia deitada na areia olhando o mar e o por-do-sol, e era uma luz, e era um céu, e era o vento, e eram os cariocas, e eram as minhas amigas todas espalhadas ali, a gente pra variar em cima umas das outras, cantando o disco inteiro da Clarice Falcão, depois Chico Buarque ("Futuros amantes quiçá se amarão sem saber com o amor que eu um dia deixei pra você"), numa plenitude dessas que de repente você sente medo de se mexer e estourar aquela bolha perfeita de felicidade que por sorte você conseguiu se enfiar. Sentia que estava deixando um pedaço meu ali pra sempre, que sempre ia me fazer falta. Não quero ir embora, não quero ir embora, não quero ir embora.
Depois dessa primeira viagem fui ao Rio outras vezes, e a cidade sempre mexe muito comigo da melhor forma possível, mas nenhuma foi tão forte quanto essa primeira. Fui para o aeroporto de coração partido, não conseguia acreditar que seria obrigada a voltar pra minha cidade feia depois de ter visto tanta coisa bonita. Acho que nunca desejei com tanta força que algo não acabasse como desejei que aqueles dias no Rio de Janeiro fossem eternos. Aí eu perdi meu voo.
Não estava atrasada. Também não estava adiantada, mas atrasada não estava. Pelo menos não tecnicamente. O que aconteceu foi que o despacho de bagagem fechou antes do esperado e não consegui embarcar com a minha mala pesada. Isso nunca tinha acontecido comigo, ninguém nunca tinha me falado o que fazer num caso desses, e passei tempo demais me desesperando e brigando com meu pai no telefone pra conseguir pensar rápido e fazer alguma coisa, tipo processar a Gol ou simplesmente embarcar e deixar minha mala pra trás, pra ser enviada depois. Eles queriam me cobrar mais de 2 mil reais pra remarcar a passagem e ainda que eu pagasse não tinha lugar nos próximos voos porque era uma volta de feriado. Não tinha como sair de lá. Se não fosse pela minha mãe (que gargalhou no telefone e disse "filha, que bom, você não queria ir embora mesmo, agora aproveita!") ou pela minha amiga Giu talvez eu estivesse até agora sentada no chão do Santos Dumont sem saber o que fazer, mas a Giu me pegou pela mão e logo estávamos de volta no Freixcão pra fazer uma surpresa pra Paloma e pros pais dela que teriam que me hospedar mais duas noites. Passamos a madrugada transformando todos os jogos que conhecíamos em drinking games e depois fomos pra praia. Foi um dia perfeito, e sei que são poucas vezes na vida que a gente realmente pode dizer que viveu um dia perfeito. Fui embora de ônibus numa viagem que durou mais de 15 horas como se tivesse ganhado um presente. O Segredo é real.
Já tive outras incidências da ação do Segredo na minha vida (kkkkkk não acredito que tô escrevendo isso), mas acho curiosa a força que isso ganha quando estou viajando, porque de repente comecei a quase perder todos os ônibus e aviões que entrei desde então, principalmente aqueles que eu não quero pegar de jeito nenhum. Em outubro do ano passado, passei uns dias em São Paulo vendo shows do Wilco e encontrando minhas amigas (melhor tipo de viagem). A campanha que eu tava trabalhando tinha acabado e encarei aqueles dias como umas feriazinhas antes da triste realidade do desemprego, então era meio óbvio que voltar pra casa não me parecia uma ideia muito agradável naquele momento. Pra completar, na minha última noite o Pedro apareceu com uma garrafa de Jean Beam e um pote de cereja maraschino pra fazer old-fashioneds pra gente. Enquanto estava sentada na cozinha bebendo meu novo drink favorito, ouvindo música alta, com uma gatinha no colo, de novo pensava não quero ir embora, não quero ir embora, não quero ir embora. Aí no meio do caminho pra rodoviária percebi que tinha esquecido a carteira em casa.
Voltamos pra pegar e perdemos uns 20 minutos, só pra encontrar uma marginal completamente parada no fim do caminho. Faltava pouco pro horário do ônibus e meu tio, uma pessoa tranquila e otimista, virou pra mim e disse: "Olha, pode ser que a gente não chegue a tempo, quer ir olhando no celular se tem passagem amanhã?". Meu estômago revirou. Eu não queria ir embora, estava desempregada e não ia fazer diferença alguma passar mais um dia fora de casa, mas desde o episódio do voo perdido nunca mais tive PAZ viajando sozinha. Perdi meu direito de revirar os olhos sempre que meus pais me recomendavam cuidado e atenção com os horários, e eu gosto muito de revirar os olhos e achar que estou acima de certas coisas. Minha família é ótima, mas também é péssima no sentido que aquele único deslize que tive num histórico de anos viajando sozinha e cuidando da minha vida foi suficiente pra que me tratassem como irresponsável pelo resto dos meus dias. Não mesmo que eu ia deixar um ônibus perdido por atraso entrar na minha ficha.
Conseguimos chegar na rodoviária e fui correndo até o guichê enquanto meu tio estacionava o carro e pegava minhas malas. Ainda tínhamos uns 5 minutos. Quando nos encontramos, percebi que estava faltando uma coisa: minha jaqueta, que ficou no chão do carro. Querido estranho, você já viajou à noite num ônibus interestadual? Se sim, você sabe que não existe a menor possibilidade de embarcar numa viagem dessas sem um casaco (ou dois!) principalmente se você for como eu, uma pessoa que sente muito frio o tempo inteiro. Lá vai meu tio correr pro carro de novo (que homem) enquanto eu corria pra plataforma pedir pelo amor de Deus pro motorista esperar. É por isso que gosto muito mais de andar de ônibus: se fosse no aeroporto àquela altura já tinham cancelado minha viagem, mas o motorista me garantiu que eles não sair e me deixar ali vendo o ônibus ir embora.
Meu tio chegou, eu vesti o casaco, agradeci o motorista até encher o saco, entrei no ônibus e comecei a chorar. Eu precisava ir embora, mas não queria.
E aí teve a Páscoa. De novo São Paulo, de novo amigas, cantorias, matando a saudade de todos os lugares queridos, incluindo uma linha de ônibus. Acabei sem companhia pro almoço num desses dias e decidi pegar o Apiacás - Praça Ramos e ir matar a saudade do meu centrinho, com aquele familiar cheiro de urina ao sol que só a praça da República oferece numa tarde de sábado. Não quero ir embora. Tomando chá de hibisco no PPD, tentei engatar a leitura das primeiras páginas de Big Little Lies, mas sentada na mesa que dava pra rua achei melhor ficar vendo as pessoas passarem, entre jovens modernos, senhoras de sombrinha e moradores de rua. Depois de um primeiro trimestre mais ruim do que bom, eu e Analu decidimos usar essa viagem pra exorcizar tudo de ruim e pesado que nos aconteceu até agora e... funcionou! O sentimento de desconexão com as coisas e com as pessoas que esteve comigo nesses últimos meses sumiu assim que cheguei na linha verde com minha mala vermelha.
No domingo à noite, quando nos despedimos, ela disse: "Olha a gente aqui em abril!" porque é sempre uma surpresa quando nossos planos dão certo. Sabe, querer muito alguma coisa, organizar, planejar, fazer contagem regressiva e chegar no final daqueles dias e perceber que tudo deu certo e foi tão perfeito como poderia ser, como eu precisava que fosse, é algo que me atinge como um pequeno milagre. Sempre espero que as coisas deem errado, principalmente as muito boas; não é pessimismo, é aprender com as experiências (e uma dose de ansiedade). Então, quando tudo funciona, é uma surpresa gostosa. Olha a gente aqui! O Segredo é real, mas acaba tão rápido.
Voltando pra casa segunda de manhã, mais uma dose de palhaçada: o primeiro Cabify que pedi estava perto e de repente começou a dirigir pra longe de onde eu estava. Quando ele atingiu os 4km de distância, cancelei. O segundo custou a sair do lugar, e quando saiu cancelou a corrida. O Uber cancelou também por motivos que até agora não entendi. O aplicativo de táxi não me deixava digitar o endereço de jeito nenhum e eu, que estava até adiantada, comecei a flertar com o perigo de perder o voo de novo. Parei um táxi no grito, na rua mesmo, e foi só no meio do caminho que lembrei de perguntar se passava cartão, já que eu tinha um total de 10 reais na carteira. O trânsito estava tão parado que deu pra eu me maquiar e passar batom vermelho no banco de trás, pra ver se me acalmava. Fiz um penteado no cabelo, adiantei trabalhos, roí todas as unhas, achei que fosse vomitar de nervoso até finalmente conseguir descer em Congonhas, onde já era chamada pro embarque. Dessa vez só tinha bagagem de mão.
Devia saber que tinha algo errado quando vi que o portão era no piso superior, porque isso nunca acontece. Voo pra Uberlândia é sempre na rodoviária e não demorou até avisarem que o nosso estava atrasado. Resmunguei, mandei mensagem pra chefe, comprei um Kit Kat que enfiei inteiro na boca me sentindo o William Holden tentando sair da casa de Norma Desmond em Sunset Blvd. e ficando preso na porta daquele lugar suspenso num delírio de passado eterno.
Acho que a mensagem aqui é que a gente precisa ter cuidado com as coisas que a gente deseja, porque às vezes elas acontecem e lutar contra elas depois é cansativo e custa uma corrida de táxi de mais de 50 reais. Cheguei em casa duas horas e meia depois do previsto, atrasada pro trabalho.
A ideia de fazer essa newsletter surgiu na casa dos meus tios em São Paulo, contei a história pra eles depois de ouvir uma história mais doida ainda sobre o poder dos números. Acontece que um amigo deles descobriu um livrinho escrito por um cara russo sobre uma técnica chamada de Código de Grabovoi, que usa sequências numéricas pra criar uma frequência vibratória que faz com que as energias fluam a favor de certas coisas. O amigo acredita tanto nisso que até passou uns códigos pra minha tia: 444, por exemplo, é a sequência que conserta a frequência energética que pode estar fazendo algum eletrônico ou eletrodoméstico não funcionar direito, e 520 serve pra atrair dinheiro.
Meu primo Pedro ouviu a história pela primeira vez junto comigo, e cartesianos que somos resolvemos usar do infalível método científico pra testar a papagaiada do Grabovoi, de modos que um adesivo com 444 foi colado na máquina Nespresso deles que só funcionava quando queria - o que era nunca. Se deu certo? Digo apenas que no feriado tomei aproximadamente 7 cafezinhos naquela casa, todos saídos direto da máquina da Nespresso. Viva a Rússia!
***
A todas as pessoas que pedem que eu use meus meios com o Segredo a favor delas, digo apenas que todas as minhas energias estão concentradas em fazer com que Harry Styles se torne meu namorado. Se eu deveria usar essa força pra dar um jeito de arrumar um emprego em São Paulo e resolver cerca de 70% dos meus problemas e melancolias? Provavelmente, mas puta que pariu vocês leram o perfil do Harry na Rolling Stone? Foi escrito pelo Cameron Crowe e só prova aquilo que sempre soube: esse menino é um anjo e o homem que sempre sonhei amar.
After almost two months, the band left the island with a bounty of songs and stories. Like the time Styles ended up drunk and wet from the ocean, toasting everybody, wearing a dress he'd traded with someone's girlfriend. "I don't remember the toast," he says, "but I remember the feeling."
"Certain things don't work out. There's a lot of things that can be right, and it's still wrong. In writing songs about stuff like that, I like tipping a hat to the time together. You're celebrating the fact it was powerful and made you feel something, rather than 'this didn't work out, and that's bad.' And if you run into that person, maybe it's awkward, maybe you have to get drunk ... but you shared something. Meeting someone new, sharing those experiences, it's the best shit ever. So thank you."
Música da Semana
Sign of the Times (Harry Styles): Óbvio, né? Já estou até um pouco atrasada pra isso, e nem é como se eu tivesse muita coisa a dizer sobre a música. Não amei imediatamente, mas ela foi crescendo pra mim quanto mais eu ouvia, e quanto mais eu escuto, mais eu gosto dela. É exatamente o que eu imaginava de uma música solo do Harry. Lembro de estar conversando com um amigo sobre isso há um tempo, nós dois especulando como seria o som dele, algo que eu não conseguia prever exatamente como seria, e era isso. Ainda brinquei que meu maior medo é que ele fosse pelo caminho mais fácil, se lançar como cantorzinho acústico-violão-Ed-Sheeran, como fez o Niall, mas que sabia que não seria assim porque as referências dele não eram essas. Rimos do jeito casual como falei isso, como se realmente conhecesse ele e pudesse falar com propriedade, mas aff gente, me deixa. Pensando nessas influências, fiz uma playlist curtinha com músicas que Sign of the Times me lembra, tem David Bowie, Lorde, Fleetwood Mac e atende pelo sugestivo nome de ME LEVA HARRY, usando o escapismo da música pra criar um clima de estar flutuando no espaço longe desse mundo real cheio de problema e coisas chatas.
+ Já fomos abençoadas com duas apresentações ao vivo da música: uma no SNL, que ele desafina largado várias vezes e isso só me rendeu pensamentos tão inapropriados que fico com vergonha de mim mesma dentro da minha cabeça, e outra no Graham Norton Show, onde ele acerta as notas e sorri demais, plmdd ME FALTA ESTRUTURA;
++ No SNL ele também apresentou uma segunda música, Ever Since New York, que não me deixou tão #impactada, mas no vídeo ele toca guitarra, então engravidei de gêmeos porque sem condições.
Links, Links, Links
- Escrevi sobre assédio, cultura do estupro, novelas, Big Brother e cultura pop (ufa!) no Valkirias;
- Também no Valkirias saiu uma crítica bem bacana sobre Big Little Lies, escrita a seis mãos, duas delas são minhas - amigas, o que foi aquele final?;
- Harry Styles: O sinal dos tempos, texto da Clara sobre a música do Harry, uma análise tão perfeita e apaixonada que tira dos meus ombros a obrigação de escrever qualquer outra coisa sobre o assunto;
- O podcast da Rookie é uma realidade, yaaaaay! Só consegui ouvir o primeiro episódio até agora, mas ele não poderia ser mais perfeito: apenas vários minutos de Tavi e Lorde conversando sobre a vida, escrita, criatividade, e todas essas coisas que amamos. No final tem Ask a Grown Man com Hilton Als dando conselhos sobre CARREIRA e FUTURO e foi honestamente um dos melhores votos de confiança que ouvi em muito tempo.
- The Return of Lorde, falando nela (vamos falar muito dela nos próximos meses), ótimo perfil da Lurdinha no NY Times. Poucas coisas tem me interessado/inspirado tanto quanto ler sobre o processo criativo da Lorde nesses longforms que tem saído sobre ela;
- Por que sentimos tanto medo de falar sobre morte?, a Karol Pinheiro perdeu a avó recentemente e fez um vídeo muito honesto e muito lúcido falando sobre o assunto, sobre a importância de se olhar a morte nos olhos e encará-la de um jeito realista, talvez a única forma de vencer um pouco do medo.
Ufa, agora acabou!
Como acontece quase sempre, voltei de viagem meio perdida e fora do ar, muito disso pelo cansaço acumulado de tantos dias dormindo muito tarde e minhas costas que já não são mais as mesmas. Foi uma semana estranha, que passou sem eu saber o que fiz, mas felizmente rolou mais um feriado pra realizar meu sonho de ter um feriado pra descansar do feriado anterior. Acho que agora volto pros eixos e espero que todos tenham uma semana ótima!
Façam como esse homem e stay beautiful! (and remember the feelings!)
Yours truly,
Anna Vitória
Sempre que quiser, responda essa newsletter como um e-mail normal e escreva para mim, vamos continuar conversando depois que o sinal bater.
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