NO RECREIO: Café japonês, rolinhos de jade e um drink no inverno
Se você está aqui há tempo suficiente, deve saber que em 2019 eu comecei um blog de resenhas sobre a cidade de São Paulo. Sou fã do formato: leitora compulsiva dos comentários deixados em páginas de hotéis no Trip Advisor, alguém que vai até a página 5 das avaliações de cada produto que compra mais pelo apreço literário do que pela função prática da coisa, uma pessoa que gosta de contar seus sonhos e refeições em detalhes, e que repara no banheiro de todos os lugares por onde vai.
Em resumo, uma chata.
Mas a internet está aí é pra dar voz pra gente que nem eu (chatos que respondem o que ninguém perguntou), então decidi transformar essa pequena obsessão em um blog - como se deve. Mas aí veio a pandemia e o Trash Advisor, que era acima de tudo um grande portal cosmopolita, perdeu sua razão de ser. Das ironias da vida: meu último post por lá foi uma retrospectiva de experiências estranhas em São Paulo, a maioria delas relacionada de alguma forma a andar em uma cidade surpreendentemente vazia. Gosto de acreditar que existe algum nó entre esses dois episódios no nosso multiverso, e que não poderia ter encerrado o projeto de um jeito melhor.
Só que eu continuo sendo aquela chata do primeiro parágrafo e sinto falta de compartilhar essas opiniões inúteis em algum lugar. Era meu desejo desde o início do blog ter uma espécie de coluna dedicada ao espírito do Trash Advisor, projeto que só tomou forma agora. Não sei se vai funcionar, mas isso a gente descobre aos poucos.
uma frescurinha gostosa
Folheto de propaganda de um rolinho de jade, em que um rosto aparece dividido na metade, em forma de Antes e Depois, para ilustrar os efeitos do produto
Com todo respeito à tradição milenar, mas eu achava que jade roller era mais uma invenção da indústria de skincare pra tirar dinheiro de trouxa.
Um tempo depois percebi que estava disposta a ser uma dessas trouxas. O capitalismo venceu demais. Mas a verdade é que existe algo legítimo nessa história. O rolinho de jade é um instrumento milenar, que remete à tradicional medicina chinesa, e nada mais é que um massageador facial que serve tanto pra você usar no fistáile e relaxar, quanto pra fazer uma pequena drenagem linfática no rosto e fugir do inchaço (alguns guias aqui e aqui). Você provavelmente não precisa disso, mas é legal demais.
Quanto à questão da troca energética com a pedra e outros benefícios místicos, deixo a critério do freguês.
Joe Jonas mostrando como se usa um rolinho de jade
Comprei o meu na Océane com 50% de desconto em uma promoção relâmpago que rolou no site (R$70 a unidade), e aproveitei para comprar um para minha avó, que também gosta muito dessas coisas bobas e gostosinhas. O aniversário dela é só dia 20, depois eu conto se foi sucesso. Comprei também o creme para a área dos olhos (R$35) da marca, mas isso foi descontrole meu.
Não sei se tá fazendo diferença do ponto de vista técnico, mas acho um barato usar o rolinho antes de dormir. Faço isso por uns 5 minutos e consigo sentir um efeito gostoso no rosto, um formigamento bom. A pedra é bem geladinha (aprendi que isso ajuda a diferenciar o jade legítimo dos fakes: pedras verdadeiras são sempre mais frias) e alivia até dor de cabeça quando usada na testa.
Rolinho de jade: 9/10
Joe Jonas: 16/10
um disquinho top demais
Michelle Zauner de vestido amarelo cercada de caquis na capa de Jubilee
Já que estamos no começo de um novo semestre faria bastante sentido compartilhar o meu disco favorito de 2021 até agora. Eu nem sei se Jubilee ocupa mesmo esse posto (para variar, estou atrasada nas novidades), mas a verdade é que foi o lançamento que que mais me deixou obcecada até agora. O título da edição passada, “Jubileu”, foi inspirado por ele, porque a pegada do disco é uma espécie de celebração a uma fase feliz depois de um momento difícil, mas sem perder de vista uma certa melancolia e acidez direcionada aos problemas que não vão embora nunca (amor não correspondido e capitalismo tardio).
Em termos de sonoridade, Jubilee me parece um trabalho da Carly Rae Jepsen com referências mais diversas e idealizado por alguém que enfrentou barras maiores que a Carly Rae Jepsen - mas também ficou viciada em The Marvelous Mrs. Maisel em algum ponto dessa jornada. A Michelle Zauner é uma espécie de prima existencialista que viu a morte de perto, igualmente encantadora mas um pouco mais estranha, um pouco mais sombria, e consequentemente um pouco mais interessante. Ela lançou um livro esse ano falando sobre luto e memórias e ele já está no meu carrinho de compras.
Japanese Breakfast - Posing In Bondage (Official Video)
Todo o visual do álbum é incrível, os clipes são lindos demais e os figurinos são de morrer. Um show perfeito pra gente ver no fim de tarde do Popload bebendo uma gin tônica superfaturada (RT se você chorou).
Minhas músicas favoritas são todas, mas principalmente “Kokomo, IN”, “Posing in Bondage” (vídeo acima), “Savage Good Boy” e “Posing For Cars”.
as leituras mais legais do semestre
A ridícula ideia de nunca mais te ver, Raios e trovões, A vida mentirosa dos adultos
Depois de um ano em que li apenas 7 livros, fiquei feliz por ter aprendido a ler novamente em 2021. Na onda de retrospectiva de meio do ano, achei que valia a pena compartilhar meus títulos favoritos até o momento. Foram eles: A Vida Mentirosa dos Adultos (Elena Ferrante), A Ridícula Ideia de Nunca Mais Te Ver (Rosa Montero) e Raios e Trovões (Bruno Capelas).
Como já escrevi bastante sobre os dois primeiros (aqui e aqui), vamos falar de Raios e Trovões, “a história do fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum”. Eu já era fã da pessoa física do autor, o que talvez me faz uma voz pouco confiável para emitir essa opinião, mas tenho certeza que, se não conhecesse Bruno Capelas, eu ia dar um jeito de forjar o encontro depois da leitura. Sou o tipo de fã de Castelo Rá-Tim-Bum que viajou duas vezes para ver a exposição em São Paulo, e em uma delas passou quase um dia inteiro na fila pra conseguir o ingresso. Apesar disso, não foi exatamente o material sobre o Castelo que mais me interessou na obra, apesar das histórias e curiosidades sobre os bastidores do programa também serem ótimas.
Eu e o Gato Pintado na biblioteca do Castelo em agosto de 2014 (!)
Raios e Trovões é sobretudo uma história de criatividade, trabalho em equipe e malucos se encontrando no mundo. É uma baita homenagem a São Paulo e à TV Cultura, do tipo que fez meu coração doer de saudades do meu buraco favorito no mundo a cada menção à região da Água Branca ou à Torre da Cultura, por onde eu passava todos os dias. O livro me fez pensar em todos os meus amigos que criam, me deu vontade de colocar ideias no mundo, e até me deixou triste por não ter dado muita bola para as aulas de história da TV brasileira na época da faculdade. Paciência.
Recomendo para todo mundo que precisa acreditar de novo.
Disclaimer: os links para compra que aparecem aqui são da minha lojinha da Amazon, e eu ganho uma comissão a cada venda - que me ajuda a manter meus EMPREENDIMENTOS ONLINE no ar - sem que você pague a mais por isso.
uma nova melhor amiga imaginária
Karen Bachini virando uma caneca enorme de café
Eu nunca tive interesse em assistir tutoriais de maquiagem. Eu também nunca tive muito interesse no Youtube de modo geral - aliás, para todos os defeitos e salvo algumas exceções, eu odeio o Youtube. O que aconteceu para que um canal no Youtube só com tutoriais de maquiagem se tornasse a minha coisa favorita da internet em 2021? Está tudo tão estranho…
Assim como aconteceu com o finado canal Bon Appétit na primeira temporada da #pands, o canal da Karen Bachini me ajudou a atravessar as angústias dessa nova fase de isolamento, medo, tristeza e vontade de colocar fogo em tudo. Em vários dias, ver a Karen se maquiando era a única coisa que conseguia me distrair. O foco do canal são maquiagens artísticas, coisa que até então eu nem gostava, mas assim como no caso do Gourmet Makes e suas receitas absurdas, eu gosto de ver alguém se dar a todo aquele trabalho por mim. Descobri que, assim como a confeitaria, maquiagem artística me acalma, me diverte e me entretém, e a Karen é a melhor pessoa do mundo fazendo isso.
RASPEI A SOBRANCELHA PRA REPLICAR UMA MAKE E VIREI O SPOCK - Karen Bachini
Outro atrativo do canal é a edição. Eu odeio todas as edições engraçadinhas que a gente vê em quase todos os vídeos, e acho que no fundo todo mundo queria fazer algo bem feito como o Saulo, editor da Karen, consegue fazer, mas ninguém chegou lá. Poderia dizer que virei fã do canal também porque Karen Bachini é uma ótima maquiadora e consegue dar explicações técnicas no meio de uma palhaçada e outra (e eu aprendi a preparar a pele com ela!); porque ela é a uma das poucas influs que têm coragem de dar opinião sincera sem medo de magoar marca; porque ela se importa com diversidade no universo da beleza e também manda muito bem falando sobre saúde mental. Mas a grande verdade é que gosto do canal porque não acho ninguém na internet engraçado, mas a Karen me faz chorar de rir e me faz pensar em algo que minha avó sempre diz: simpatia é dom de Deus.
Dá vontade né internet?
10/10
um negocinho
Uma sexta-feira à noite fofocando com amigues. Completamente normal.
Meu presente para mim mesma de feliz-emprego-novo a oportunidade de ter uma produção própria e autoral de old-fashioned em minha residência. O drink se tornou uma obsessão pessoal desde aquele episódio de Mad Men em que Don Draper prepara um desses para e ele e um desconhecido no bar, a começar pela forma como ele pula o balcão e sua destreza elegante para cortar cascas de laranja.
“É isso que eu quero” (não disse o quê), pensei.
Don Draper Makes an Old Fashioned
Apesar de ser um drink simples e com poucos ingredientes, fazer um old fashioned em casa não é um negócio necessariamente barato - foram meses até criar coragem para fazer esse #investimento. Foi a primeira vez que comprei uma garrafa de destilado que não fosse para dar de presente, além do passo importante na vida de toda pessoa arrombada metida a chefe de bar informal: a angostura própria, um verdadeiro rito de passagem. Mas hoje eu não vim falar de old-fashioned (ainda estou aperfeiçoando minhas técnicas), mas sim de sua base, o bourbon. Eu quero mergulhar numa piscina de Bulleit.
“Cheira aqui esse uísque”, minha amiga Ana Clara sempre diz quando saímos pra beber, e eu cheiro com prazer, invento algumas coisas inteligentes para falar, mas confesso que cumpria o ritual mais pela graça do que qualquer outra coisa. Então comprei um Bulleit (R$130 em uma promoção da Amazon) e entendi tudo. O cheiro de mel e madeira que sai daquela garrafa é um negócio pronto pra virar uma memória olfativa carregada de significado. Por causa do cheiro, tenho até preferido curtir o bourbon puro mesmo, desce quentinho e redondo demais.
Quem manja muito da bebida deve estar me achando emocionada além da conta, já que o Bulleit é aquilo que chamam de “rótulo de entrada” (para noobs), mas o nome desse quadro é Trash Advisor por um motivo.
15/10
Algum dia eu volto com notícias do old-fashioned. Beba com moderação.
É hora de dar tchau
O sinal já bateu e precisamos voltar para a vida real, mas obrigada pela companhia em mais um recreio. Espero que vocês tenham gostado do formato e, como sempre, aceito sugestões. Se quiser compartilhar alguma coisa legal que tenha marcado seu mês de junho ou esse primeiro semestre, vou adorar saber. É só responder esse e-mail como uma mensagem normal. Você também me encontra no me dar um alô no Twitter, no Instagram ou noCurious Cat.
A próxima newsletter deve sair na segunda-feira, dia 12. Se puder ir às ruas amanhã, se cuide, se proteja, mas vá. Se não puder, ajude de casa mesmo: compartilhe informações, converse com sua família sobre a importância dos atos, xingue muito no Twitter pra colocar pressão nesses desgraçados, e veja como se engajar na luta da sua cidade.
E, claro, stay beautiful!
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Por anna vitória
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Curadoria cuidadosa de anna vitória via Revue.
na pior cidade da américa do sul, brazil